As Fronteiras do Direito Administrativo

18-12-2022

O presente trabalho incide nas fronteiras do Direito Administrativo, tendo em conta a opinião do professor Freitas do Amaral. O Direito Administrativo estabelece relações com outros ramos do Direito, que irei analisar de seguida.

Começando pelo Direito Privado, é sabido que este e o Direito Administrativo são dois ramos do direito totalmente diferentes. O direito privado ocupa-se das relações estabelecidas pelos particulares entre si na vida privada; o Direito Administrativo ocupa-se da Administração Pública e das relações de direito público que se travam entre ela e outros sujeitos de direito, nomeadamente os particulares.

Deste modo, o Direito Administrativo e o direito privado têm quatro principais elementos de distinção: (1) o seu objeto, mencionado anteriormente, (2) a sua origem, dado que o direito privado nasceu na Roma antiga, enquanto o Direito Administrativo nasceu na revolução francesa, (3) a sua idade, (4) e as suas soluções materiais: o direito privado adota soluções de igualdade entre as partes e o Direito Administrativo adota soluções de autoridade. Isto porque, o direito privado assenta no princípio da liberdade e da autonomia da vontade e o Direito Administrativo no princípio da prevalência do interesse coletivo sobre os interesses particulares.

No entanto, apesar das diferenças entre estes dois ramos do direito, também são idênticos em alguns aspetos: o Direito Administrativo começou por ir buscar determinadas noções ao Direito Civil, justamente porque o Direito Civil tem sido o repositório comum da tradição jurídica europeia, e também porque há princípios gerais de direito incluídos em diplomas de direito privado. Nos dias de hoje, não é apenas o Direito Administrativo que vai buscar determinados conceitos ao Direito Civil, como o direito privado em geral, que que vai buscar muito ao Direito Administrativo. Isto acontece devido ao facto de que o Direito Administrativo teve, entretanto, a hipótese de aprofundar determinadas noções, em que hoje é mais rico do ponto de vista da técnica jurídica do que o direito privado.

Além disto, apesar da autonomia própria que o Direito Administrativo possui, tem influências recíprocas: por um lado, assiste-se atualmente a um movimento muito significativo de publicização da vida privada, muitas matérias que tradicionalmente eram de interesse privado assumem hoje um significado público e, a esse título, são tratadas pelo Direito Administrativo ou influenciadas por este. Por outro lado, assiste-se também a um movimento não menos significativo de privatização da administração pública. Na medida em que o Estado moderno busca uma maior eficácia, maior produtividade, ou melhor rendimento, o legislador permite que a Administração adote formas de atuação próprias do direito privado, justamente nos casos em que essas formas se tenham revelado mais eficientes na vida privada.

No plano das soluções concretas, é hoje vulgar assistir-se à adoção do Direito Administrativo de certas soluções inspiradas por critérios tradicionais do direito privado, tal como a adoção, muito frequente, das soluções inovadoras oriundas do Direito Administrativo.

Assim, é possível concluir que apesar dos aspetos que distinguem o direito privado do Direito Administrativo, notam-se, entre ambos, importantes influências recíprocas.

Passando para o Direito Constitucional, este que está na base e é o fundamento de todo o direito público de um país e o Direito Administrativo é, em múltiplos aspetos, o complemento, o desenvolvimento, a execução, do Direito Constitucional. Em grande medida as normas de Direito Administrativo são consequência de normas de Direito Constitucional.

Se o Direito Constitucional de um país estabelece um regime ditatorial ou um regime democrático, assim o Direito Administrativo se desenvolverá numa ou noutra orientação. É importante notar que muitas normas formalmente são Direito Constitucional por estarem na Constituição, mas que materialmente, pela sua natureza, conteúdo ou essência são normas de Direito Administrativo. É o caso das normas que a Constituição contém sobre a administração pública em geral, sobre os funcionários públicos ou sobre as Forças Armadas, por exemplo. Todas estas normas são formalmente constitucionais (por estarem presentes na Constituição), mas são materialmente administrativas, por dizerem respeito à organização e à atividade da Administração Pública ou às relações desta com outros sujeitos de direito. No entanto, há também normas de Direito Administrativo que não integram a Constituição e que dizem respeito a órgãos políticos de que a Constituição se ocupa: o Governo é um órgão simultaneamente político e administrativo; o seu estatuto jurídico encontra-se na Constituição, mas o seu estatuto jurídico, enquanto órgão administrativo, em grande parte está fora da Constituição, é regulado em leis administrativas avulsas. Estas leis são normas de Direito Administrativo que, não pertencendo à constituição, ajudam, todavia, a definir o estatuto jurídico global de um órgão que, no essencial, é regulado pela Constituição. Por isto se defende, tal como referi anteriormente, que o Direito Administrativo complementa o Direito Constitucional.

Quanto ao Direito Judiciário, constituído pelas normas que regulam a organização e o funcionamento dos tribunais e disciplinam o desempenho, por estes, da função jurisdicional, pode dizer-se ser muito idêntico ao Direito Administrativo. Isto porque, regula serviços públicos que visam satisfazer uma necessidade coletiva - a justiça - e que só em homenagem ao princípio de separação de poderes é que não pertencem, atualmente, à Administração Pública.

O Direito Penal é o ramo do direito público constituído pelo sistema das normas que qualificam certos factos como crimes e regulam a aplicação aos seus autores de penas criminais, este visa proteger a sociedade contra os factos ilícitos mais graves que nela podem ter lugar e protege-a, estabelecendo para esses factos as sanções mais graves que a ordem jurídica permite aplicar. O Direito Administrativo, por seu lado, visa a satisfação das necessidades coletivas de segurança, cultura e bem-estar.

Relativamente à cultura e bem-estar, esta não parece suscitar-nos nenhuma questão, porém, quanto à segurança, pode à primeira vista haver uma certa confusão: se o Direito Penal visa proteger a sociedade contra o crime e o Direito Administrativo visa satisfazer a necessidade coletiva da segurança, não será que ambos prosseguem o mesmo objetivo? É claro existir aqui uma certa sobreposição, mas ela não se dá no mesmo plano, dá-se sem planos diferentes.

Segue-se a explicação:

Enquanto o Direito Penal é um direito repressivo, isto é, tem fundamentalmente em vista estabelecer sanções penais que hão de ser aplicadas aos autores de crimes, o Direito Administrativo é, em matéria de segurança, essencialmente preventivo. As normas de Direito Administrativo não visam cominar sanções para quem ofender os valores essenciais de uma sociedade, mas sim estabelecer uma rede de precauções, de tal forma que seja possível evitar a prática de crimes ou a ofensa aos valores essenciais a preservar. Por exemplo, podemos referir que um valor fundamental de qualquer sociedade civilizada é a vida humana, o direito à vida. O Direito Penal protege esse valor fundamental, proibindo os atentados contra a vida humana e estabelecendo para a violação da norma correspondente uma sanção - pena criminal.

O Direito Administrativo, pelo contrário, procura, no contexto da função preventiva de segurança que lhe pertence, estabelecer normas que contribuam para evitar a prática de crimes. Como tal, dá poderes à polícia para fiscalizar determinados locais perigosos, cria formas de controlar situações que sejam mais propícias à prática de crimes, estabelece regras disciplinadoras de certas atividades que envolvem riscos para a vida humana, entre outras.

Assim, apesar do objetivo ser em grande parte comum (garantir a segurança das pessoas e dos valores fundamentais da vida em sociedade), os planos são diferentes.

Enquanto o Direito Administrativo é preventivo, o Direito Penal é repressivo.

Direito Administrativo e Direito Internacional

É conhecida a noção de Direito Internacional, ou Direito Internacional Público. Neste incluem-se certas normas jurídicas que dizem respeito às administrações públicas dos Estados e que, uma vez aceites por estes, sobretudo através da celebração de tratados, passa a regular em cada país aspetos importantes da sua vida administrativa interna: é aquilo a que se chama o Direito Internacional Administrativo. Estas normas jurídicas são internacionais pela sua natureza, mas administrativas pelo seu objeto.

Contudo, não devemos confundir o Direito Internacional Administrativo, que nos interessa na medida em que, provindo de uma fonte internacional, se destina a regular aspetos da administração pública interna, com o Direito Administrativo Internacional, que é o direito administrativo próprio das organizações internacionais. Serve de exemplo a ONU, que tem os seus serviços administrativos, os seus funcionários, a sua burocracia. A esses serviços, funcionários e burocracia, aplicam-se regras que são administrativas pela sua natureza, mas internacionais pelo seu objeto. Essas normas são de Direito Administrativo Internacional e não fazem parte do Direito Administrativo Interno.

Não devemos esquecer o poderoso contributo que, nas últimas décadas, o Direito Administrativo tem dado para a elaboração normativa, jurisprudencial e científica do Direito Comunitário europeu, cujo sistema de garantias contenciosas foi construído com base no contencioso administrativo de anulação dos países inspirados no modelo francês.

É ainda crescente o número de normas comunitárias que modificam e condicionam o Direito Administrativo interno como, por exemplo, a liberalização de certos serviços públicos tradicionais (energia, telecomunicações), com a formação de certos contratos administrativos (empreitadas, fornecimentos) e com o regime jurídico da concorrência e dos preços, etc.

Atualmente, já não é possível conhecer por inteiro o Direito Administrativo de qualquer país membro da União Europeia sem conhecer bem o Direito Comunitário.

Assim, concluo que apesar das diferenças existentes entre o Direito Administrativo e outros ramos do direito analisados supra, as suas recíprocas influencias surgidas ao longo da história se sobrepõem e são benéficas em relação às distinções.

Bibliografia:

https://psicanalisarodireitoadministrativo16b.blogs.sapo.pt/as-fronteiras-do-direito-administrativo-5104

AMARAL, Diogo Freitas do. O Curso de Direito Administrativo, Volume I, 4ª edição, Almedina, 2016.

Joana Jorge, nº66650

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