Direito comparado- Sistema Britânico versus Francês

16-12-2022

Direito comparado: Sistema Francês e Sistema Britânico

1. Introdução:

Existem dois modelos de administração, o sistema executivo (francês) e o sistema judiciário (britânico).

É uma realidade, que na fase inicial, estes apresentavam grandes dicotomia entre si, porém, ao longo dos tempos, sofreram uma evolução e aproximaram-se.

Para onde se difundiram e onde foram utilizados? O sistema francês difundiu-se para a Europa, e entre os países podemos encontrar Portugal. O sistema britânico foi difundido, sobretudo, para os países Anglo-Saxónicos, entre os quais se encontra o Brasil e Estados Unidos da América.

2. Características do sistema britânico:

Este sistema tem como aspetos fundamentais a lenta formação ao longo dos seculos, o papel destacado do costume como fonte de direito, a distinção entre Common law e equity, a vinculação à regra do precedente e a grande independência dos juízes bem como forte prestígio do poder judicial.

Como principais características tradicionais deste sistema de administração podem ser referidas:

  • Descentralização- a administração não é centralizada, não concentra em ti todos os poderes. Esta distingue-se em administração central (Central Government) e administração local (Local Government).
  • Sujeição da Administração aos tribunais comuns- trata-se de uma unidade de jurisdição. Os tribunais comuns (courts of law) julgam tanto os litígios referentes à administração pública como os litígios entre os particulares. Acontece que não existem tribunais administrativos, e, por isso, a administração pública está sujeita à aplicação da lei por parte dos tribunais comuns. Se qualquer litígio surgir entre particulares e a administração publica, não existem tribunais especiais para a resolução do problema, vigora a jurisdição normal dos tribunais comuns.
  • Subordinação da Administração pública ao Direito Comum- como consequência do chamado "the Common law of the land" ou "rule of law", todas as pessoas se regem pelo mesmo direito, independendo de quem seja. Uma vez que só existe o direito comum aplicado pelos tribunais comuns, e não um direito administrativo, a administração encontra-se subordinada ao mesmo, não dispondo de privilégios ou de prerrogativas de autoridade pública.
  • Execução judicial das decisões administrativas- a administração não goza de poderes para executar as suas decisões por autoridade própria, tendo de se dirigir a um tribunal. Se um particular, no entanto, não cumprir o seu dever, e uma vez que a administração não dispõe de meios coativos, pode recorrer a um tribunal com vista à obtenção de uma sentença, para garantir que o particular cumpra.
  • Garantias jurídicas dos particulares- não pode haver abusos ou ilegalidade por parte da administração publica, caso aconteça, os particulares podem recorrer aos tribunais públicos e, como acontece na execução judicial das decisões administrativas, mas do outro ponto de vista, pode o particular recorrer ao tribunal publico e ordenar às autoridades administrativas que cumpram a lei.

3. Características do sistema francês:

Cabe-me primeiro salientar que este sistema é o que vigora em Portugal desde o ano de 1832.

Este sistema tem como traços essenciais a irrelevância do costume, a sujeição a reformas globais impostas pelo legislador em dados momentos, o papel primordial da lei como fonte do direito, a distinção básica entre direito privado e direito publico, a função da importância variável dos tribunais na aplicação do direito legislado, a maioritária influência da doutrina jurídica face a jurisprudência e o maior prestígio do poder executivo face o poder judicial.

Como principais características podemos salientar as seguintes:

  • Separação de poderes- a administração ficou separada, aquando do surgimento deste sistema, entre poder executivo por um lado e poder judicial por outro.
  • Centralização- com a revolução francesa foi necessário vencer resistências suscitadas e por isso tornou-se necessário a criação de um aparelho administrativo eficaz e disciplinado.
  • Sujeição da Administração aos Tribunais Administrativos- face uma interpretação do principio da separação de poderes, os tribunais judiciais comuns não poderiam interferir com o funcionamento da administração pública, uma vez que se o poder executivo não podia inserir-se nos assuntos da competência dos tribunais, o poder judicial também não poderia interferir no funcionamento da Administração Pública.
  • Subordinação da Administração ao Direito Administrativo- temos de ter em conta que a resolução dos litígios da Administração é levada a cabo pelos tribunais administrativo. Houve, neste sistema, a criação do Direito Administrativo, que veio regular a forma como a Administração pode utilizar os seus poderes especais. Esses poderes especiais, ou poderes de autoridade surgiram porque veio a concluir-se que os órgãos e agentes administrativos não estavam na mesma posição dos particulares. Cabe acrescentar que, face o surgimento de poderes de autoridade especiais, estes acarretaram também restrições que não vigoram em relação aos particulares.
  • Privilégio da execução prévia- o Direito Administrativo confere à Administração poderes "exorbitantes" sobre os cidadãos, por comparação com os poderes "normais" reconhecidos pelo Direito Civil aos particulares nas relações entre si. Este privilégio de execução previa permite à administração executar as suas decisões por autoridade própria, não precisa de recorrer ao tribunal para impor uma coação a um particular quando este não acata voluntariamente a decisão.
  • Garantias jurídicas dos particulares- são alcançadas através do recurso aos tribunais administrativos onde os direitos subjetivos públicos são invocáveis contra o Estado. O estado é responsabilizado por todos os atos praticados pelos seus funcionários e garante aos particulares as respetivas indemnizações, assumindo então a responsabilidade perante os cidadãos.

4. Confronto entre os dois:

Como traços que distinguem os dois sistemas de administração a lei aplicável (Direito Administrativo ou Direito Comum), a existência de poderes de tutela de administração (Auto-tutela ou Hetero-tutela), a organização dos tribunais (Contencioso Administrativo) e a organização administrativa.

  • Organização administrativa- enquanto um é centralizado, o outro é descentralizado.
  • Poderes de tutela de administração- no sistema inglês, em caso de uma ordem administrativa não ser respeitada por um particular, é necessária uma sentença do tribunal para proceder á execução da decisão administrativa, enquanto no sistema francês, não é necessária a intervenção do tribunal pelo que a Administração pode obrigar o particular a obedecer através de medidas coercivas.
  • Direito regulador da Administração- enquanto no sistema inglês a Administração é regulada pelo direito comum (direito privado) e no sistema francês é regulada pelo direito administrativo (direito publico).
  • Organização dos tribunais- enquanto no sistema inglês a administração está subordinada aos Tribunais Comuns que têm amplos poderes, havendo so uma jurisdição, dos tribunais comuns, no sistema Francês, a administração é independente do poder judicial uma vez que existem os Tribunais Administrativos que são responsáveis por solucionar litígios administrativos.

5. Evolução e situação atual entre ambos:

  • Em termos de organização administrativa, o modelo britânico tornou-se ainda mais centralizado enquanto a francesa foi perdendo o carater de total centralização.
  • No respeitante ao controlo jurisdicional da administração, mantiveram-se as diferenças dos sistemas, os administrative tribunals da Inglaterra não são semelhantes aos tribunaux adminitratifs de França, a administração inglesa continua sujeita ao controlo dos tribunais comuns.
  • No que toca ao direito regulador da administração, deu-se uma certa aproximação entre os sistemas, uma vez que em Inglaterra surgiram milhares de leis administrativas "administrative law".
  • Quanto à execução das decisões administrativas, houve uma aproximação porem não tao pronunciada. Na Grã-Bretanha surgiu uma entidade denominada administrative tribunals mas "não são autênticos tribunais, mas sim órgãos administrativos independentes, criados juntos da administração central, para decidir questões de direito administrativo".
  • Quanto às garantias jurídicas dos particulares, são globalmente superiores no sistema britânico, quando em relação com o sistema francês, porém, importa referir que em Inglaterra os tribunais não podem por via da regra substituir-se à administração no exercício dos poderes discricionários que a lei lhe atribui.

6. Considerações finais:

É uma realidade a criação de uma aproximação com o tempo entre ambos, uma vez que ambos tentam alcançar a estabilidade e bom funcionamento.

Existe ainda quem defenda que ambos continuam a apresentar características distintas, enquanto outros defendem que os sistemas chegaram a um ponto de convergência tão forte que já, ou quase, não existem divergências.

O professor Diogo Freitas do Amaral, defende que a evolução trouxe uma "aproximação relativa dos dois sistemas em alguns aspetos", porém, continuam a existir muitos traços distintivos dos dois sistemas "houve de facto uma significativa aproximação entre eles", porem, "o princípio fundamental que inspira cada um (...) é diverso".

A meu ver, houve, de facto, uma grande aproximação entre ambos, no entanto continuam, realmente, a residir diferenças, precisamente, no que toca ao controlo jurisdicional da administração e à execução das decisões administrativas e creio que cada vez os dois sistemas vão aproximar-se mais, uma vez que, tal como o professor Diogo Freitas do Amaral diz, o facto de ambos os países pertencerem à União Europeia não vai deixar de contribuir para que se reforce uma aproximação por ambos.


Bibliografia:

Apontamentos das aulas teóricas.

Freitas do Amaral, Diogo- Curso de direito administrativo Volume I. Almedina, 3ª edição.

Sabrina Oliveira, 66300.


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