Privatização da EDP

16-12-2022

A essencialidade deste tema surge devido a uma notícia de outubro deste ano sobre a subida da fatura da luz, denunciada pelo PSD, e por sua vez também é criticado pelo BE a privatização da energia em Portugal (https://www.publico.pt/2021/10/06/politica/noticia/psd-denuncia-insuportavel-factura-luz-portugal-be-critica-privatizacoes-energia-1980051 ).

A eletricidade portuguesa, ao contrário dos outros países da União Europeia é privatizada, ao longo desta análise, iremos centrar-nos na privatização de uma das grandes empresas de energia, a EDP.


A privatização da EDP surge devido ao aumento da dívida estatal que resultou numa intervenção da Troika, o estado piorou acumulando défices orçamentais e reconhecendo responsabilidades passadas. Fazia parte do memorando de entendimento entre o Estado Português e a Troika assinado a 17 de maio de 2011 que o governo se comprometeria a "procurar um rápido desinvestimento" até final de 2011, em resposta a tal uma das soluções utilizadas foi recorrer a um conjunto de privatizações, para além da EDP também se privatizou a REN, CTT e ANA. O decreto de lei que regula o início da alienação da totalidade da participação de entidades públicas no capital da EDP é o Decreto-lei 106-A/2011, de 26 de Outubro e nesse mesmo diploma demonstra as razões anteriormente referidas nesta análise que levaram à privatização, isto é, o "cumprimento dos objectivos e das medidas previstas no Programa de Assistência Financeira acordado com a União Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu, tendo em vista retomar a credibilidade financeira do País e a confiança internacional na economia portuguesa" e da mesma forma, "diminuição do peso da dívida pública na economia, com efeitos positivos no esforço de consolidação orçamental, visando ainda reforçar a presença de investidores de diversas categorias no mercado português e facilitar a diversificação das fontes de financiamento das empresas nacionais".


O estado detinha 21,35% na EDP e em 2011 decidiu vender a uma empresa chinesa, essa parte. O controlo do risco orçamental é um dos objectivos centrais da política de privatizações e as receitas obtidas através da privatização em 2012 foram destinadas ao Estado, dívida pública e Parpública ( Participações Públicas), foi obtido um valor bruto de 2.690 euros. A China Three Gorges foi a empresa escolhida pelo Estado Português na última ronda de privatização, vencendo a concorrência das marcas brasileiras Eletrobras e Cemig e da alemã E.ON. 21,35% do capital foi vendido à empresa chinesa com a maior participação accionista como contrapartida de 2,69 mil milhões de euros e da abertura de linhas de financiamento fundamentais para o futuro da EDP.

Antes de analisarmos as consequências desta privatização, temos de perceber se antes esta empresa inseria-se na administração do Estado e o que aconteceu a seguir.

Com efeito, podemos concluir que era uma empresa pública, com personalidade jurídica, que não se integrava na personalidade jurídica do Estado. Ao não estar incorporado no estado, ficava em causa a prossecução de fins ou atribuições do Estado. Então essa prossecução era feita através de outras pessoas coletivas, distintas do Estado. Assim, inseria-se na administração estadual indireta sendo que este tipo de manifestação se designa, segundo o professor Freitas de Amaral, por ser uma atividade administrativa do Estado, realizadas, para a prossecução dos fins deste, por entidades públicas dotadas de personalidade jurídica própria e de autonomia administrativa ou administrativa e financeira".

Posteriormente, a privatização da EDP levou a que passasse de uma empresa pública para uma sociedade anónima, como nos diz no contrato de sociedade no cap. I art. 1 "A sociedade adopta a forma de sociedade anónima e a denominação EDP Energias de Portugal, S.A. (abreviadamente, EDP)." De facto, uma sociedade anónima é uma natureza jurídica que tem como principal característica a divisão por ações, isto é, a participação e a responsabilidade de cada sócio, chamados de acionistas, está totalmente vinculada e limitada ao preço de emissão das ações que adquirir. E dessa forma, passa a ser uma empresa totalmente privada que o estado não detém nenhum poder sobre, sendo que a percentagem que antes era por ele adquirida foi alienada. Isto traz imensas repercussões para o Estado português e cidadãos portugueses que iremos analisar seguidamente.

Com efeito, na altura em que se vivia, com a dívida pública cada vez mais a aumentar, a pressão da Troika e o resgate levaram a que o Estado português olhasse para a privatização da EDP, a alienação total dos bens que possuíam nessa empresa como a única solução para combater o problema. Contudo, a verdade é que a longo prazo essa escolha acabou por se verificar errada na medida em que não tendo o estado a possibilidade de dispor sobre esta empresa, ficou sujeito às discricionariedades dos custos e da mesma forma teve outras consequências vivamente enunciadas pela comunicação social e por partidos políticos que vivenciaram esse período de privatizações ainda o comparam atualmente. A EDP não é desconhecida para muitas pessoas, quer seja através de anúncios, de publicidade, de notícias ou eventos, esta empresa é veemente conhecida e é das maiores empresas de eletricidade em Portugal, mas não nos devemos de enganar pelo seu nome, a verdade é que a "Eletricidade de Portugal " não tem como prioridade o regime elétrico português, com a privatização da EDP foi assistido "um desinvestimento e desaproveitamento de recursos nacionais em contraste com investimentos de carácter duvidoso no estrangeiro, a despedimentos e o ataque aos direitos a milhares de trabalhadores, a uma persistente subida das tarifas energéticas que sufocam a vida das famílias e estrangulam a economia nacional" ( https://www.pcp.pt/privatiza%C3%A7%C3%A3o-da-edp-um-golpe-na-soberania-nacional).

O Estado perdeu o controle nacional, perdeu a soberania, mas isso não foi tudo. Para além de ter existido desinvestimento, com a alienação de alguns ativos importantes, caso das seis barragens vendidas à Engie, em 2019, por €2,2 mil milhões. A verdade é que a EDP dava lucros e pagavam dividendos, uma notícia de 2015 diz-nos que "os chineses já recuperaram por via dos dividendos brutos, um pouco mais de 20% do que investiram na EDP, em quatro anos." ( https://observador.pt/especiais/dinheiro-das-privatizacoes/amp/ ); notícias mais recentes, deste ano, dizem-nos que os dividendos pagam 60% do investimento chinês, o valor da participação da China Three Gorges na elétrica mais do que duplicou ( https://visao.sapo.pt/exame/2022-10-26-edp-ren-ctt-e-ana-o-antes-e-o-depois-das-empresas-vendidas-pelo-estado-nos-tempos-da-troika/) . O próprio Tribunal de contas numa auditoria concluída em 2015 diz-nos que "o timing imposto para a concretização destas operações representou para o Estado Português um custo de oportunidade ou alternativo, que correspondeu à concretização da operação num enquadramento económico muito negativo e à perda de dividendos futuros, anualmente distribuídos por estas empresas". Voltar atrás seria muito difícil.

Atualmente o que acontece é algo muito perverso, o Estado pouco pode fazer perante as contas que cada vez aumentam, qualquer decisão de taxação do limite de preço da luz feita pela UE, é muito difícil ser de facto seguida pelo Estado sendo que a maior parte das empresas de eletricidade são totalmente privadas.

Surgiram um conjunto variado de propostas no seguimento desta privatização e uma delas feita pelo PCP foi que "propõe para o país, a necessidade de recuperar o controlo público dos sectores básicos e estratégicos da economia, incluindo na energia, colocando-os ao serviço dos trabalhadores, do povo e do país, e não dos interesses dos grupos económicos e financeiros" (https://www.pcp.pt/privatiza%C3%A7%C3%A3o-da-edp-um-golpe-na-soberania-nacional).

Uma outra proposta para combater a realidade atual poderia ser a diminuição do valor do IVA relativo à eletricidade, isso é algo que é da competência do Estado, algo que ele controla e poderia fazer com que se diminuísse os efeitos dos preços sentidos pela população, ainda mais neste período de inverno, com temperaturas baixas onde poucas famílias conseguem recorrer a aquecedores elétricos ou até a eletricidade. Contudo, é tido em conta que se se procedesse a isto o que aconteceria seria um aumento da dívida pública e um aumento de custos a pagar pelo Estado à EDP. Outra solução poderia ser a criação de uma nova empresa pública que controle a eletricidade portuguesa e que seja da administração indireta do Estado, sendo que a possibilidade de desprivatizar a EDP é muito remota e impossível. Este acontecimento deve ser visto como uma aprendizagem sobre o que fazer ou não fazer no futuro quando o Estado quiser diminuir a dívida pública.


Bibliografia

Amaral,  Diogo Freitas- Curso de Direito Administrativo



Maria Marques,66370


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